O Guardião da Capoeira Angola
Vicente Ferreira Pastinha nasceu em Salvador, Bahia, no dia 5 de abril de 1889. Filho de José Señor Pastinha, descendente de espanhol, proprietário de um pequeno armazém, e de Raimunda dos Santos, uma negra nascida em Santo Amaro da Purificação, a qual teve pouco contato.
Pastinha deixou gravado no museu da Imagem e do Som , no ano de 1967, um depoimento onde ele conta, entre outras coisas, como conheceu a capoeira. "Quando eu tinha uns dez anos de idade, eu era franzino, um outro menino, mais taludo que eu tornou-se meu rival. Era só eu sair para rua, ia fazer compras por exemplo e a gente se pegava em briga. Só sei que acabava apanhando sempre. Então eu ia chora escondido de vergonha e tristeza. Contava ainda o tal menino com o apoio da mãe. Um dia, da janela de sua casa, um velho africano assistiu a uma briga da gente. 'Vem cá, meu filho', ele me disse, vendo que eu chorava de raiva depois de apanhar. Você não pode com ele, sabe, porque ele é maior e tem mais idade. O tempo que você perde empinando arraia vem aqui no meu cazuá que vou lhe ensinar coisa de muita valia. Foi isso que o velho me disse e eu fui. Ele arrastava os móveis da sala e deixava um espaço livre onde me ensinava a jogar capoeira, todo dia um pouco e aprendi tudo. Ele costumava dizer: não provoque, menino, vai botando devagarzinho ele sabedor do que você sabe. Um ano depois, encontrei o menino na rua. Ele me perguntou: estava viajando ou estava se escondendo com medo de mim? Eu lhe respondi: estava com medo. A mãe do menino já se encontrava na porta, sorrindo divertida, esperando o início do espetáculo, quando seu filho venceria novamente a batalha. Mas para surpresa aconteceu ao contrario. Assim que o menino levantou a mão para desferir a pancada, com um só golpe fiz ele sabedor do que eu era capaz. E acabou-se meu rival, o menino ficou até meu amigo de admiração e respeito. O velho africano chamava-se Benedito e quando me ensinou o jogo tinha mais idade que eu hoje".
Aos doze anos, Pastinha ingressou na escola de aprendizes da marinha, onde foi músico e instrutor de capoeira, foi jogador de futebol, chegando a treinar na equipe do Ypiranga, seu time do coração, que possui as cores preto e amarelo as quais serviram de uniforme para sua escola de capoeira, foi engraxate, vendeu jornais, praticou esgrima, trabalho na construção do Porto de Salvador, foi alfaiate, fez garimpo e também tomou conta de "casa de jogo", ocupando o cargo de "leão de chácara" (segurança). Tudo isso foi uma forma de se manter financeiramente mas seu desejo era viver de sua arte, pois além de capoeirista era poeta popular, tendo contribuído com seus pensamentos e versos para o entendimento da capoeira como uma filosofia de vida.
Em 1941 a convite do seu ex-aluno Aberrê foi ao bairro da Liberdade, na ladeira do Gengibirra, onde formava-se todos os domingos uma roda de capoeira. Lá se encontravam os maiores mestres da Bahia. Mestre Pastinha aceitou o convite e passou a tarde a "vadiar" e assistir aos outros mestres, inclusive seu ex-aluno Aberrê, que já era famoso no local. No fim da tarde, eles se reuniram e em nome de todos os mestres ali presentes, um dos maiores mestres da Bahia de nome Amorzinho, entregou a Capoeira Angola ao Mestre Pastinha, para que ele tomasse a frente e a colocasse em seu devido lugar. Pastinha ainda tentou se esquivar desculpando-se, porém Antônio de Maré disse: 'não há jeito não, Pastinha, é você quem vai "mestrar" isso aqui. Diante do acontecimento ele fundou o Centro Esportivo de Capoeira Angola, situado no largo do Pelourinho, 19, onde hoje funciona o SENAC e posteriormente na rua Gregório de Matos, 51. Registrando-o em 1952, favorecendo com isso, para o desenvolvimento da Capoeira Angola na Bahia.
Os grandes capoeiristas da época sempre estavam presente nas rodas de Mestre Pastinha, além de turistas e personalidades do mundo como o escritor Jorge Amado, o pintor Caribé, o filósofo Jean-Paul Sartre e o ator Jean-Paul Belmondo.
Em abril de 1966, foi à África, representar o Brasil no I Festival Mundial de Arte Negra, em Dakar(Senegal), recebendo várias homenagens dos participantes e promotores do festival.
Em 1971, quando já estava velho e cego, disseram-lhe que teriam de fazer algumas reformas no conjunto arquitetónico do pelourinho e teria que se mudar para quando a reforma ficasse pronta ele voltar. Pastinha acreditou e saiu, na mudança perdeu móveis, instrumentos, fotos e passou a receber uma quantia simbólica que mal garantia seu sustento. No dia da entrega do prédio Pastinha ficou sabendo que a prefeitura tinha doado-o ao Patrimônio Histórico da Fundação Pelourinho, que vendeu ao Senac, Pastinha caiu numa profunda depressão.
Em fins de 1979, sofreu um derrame celebral e após um ano de internação em hospital público foi enviado para o Abrigo D. Pedro II. Em 13 de dezembro de 1981, aos 92 anos morre cego, esquecido e na miséria um dos maiores nomes da história da capoeira Pastinha viveu até aos 92 anos de idade, dos quais 82 dedicados à causa da capoeira.
Capoeira Angola na Bahia – Autor Mestre Bola Sete
A Arte da Capoeira - Autor Camille Adorno.
Revista Praticando Capoeira: edição especial Pastinha uma vida pela capoeira
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